Católica, 27 de Janeiro
Posted January 27th, 2005 at 11:09 pmNo Comments Yet
Divulgados hoje na RDP e RTP e amanhã no Público, estes são os resultados que foram mais destacados da sondagem da Católica:
PS: 46%
PSD: 28%
CDU:8%
BE:8%
CDS-PP:6%
OBN: 4%
A forma como estes valores foram obtidos, de forma a serem directamente comparáveis a resultados eleitorais, foi a seguinte. Os resultados “brutos” (a distribuição das respostas directas das pessoas a quem foi perguntado se iriam votar e, se sim, em que partido votariam) foram estes:
PS:23%
PSD: 14%
CDU(PCP/PEV): 4%
BE: 4%
CDS/PP: 3%
Outros partidos: 1%
Brancos/nulos: 4%
Não tenciona votar: 15%
Não sabe/não decidiu: 22%
Recusa responder: 11%
A partir daqui, a pressuposição foi a de que os declarados indecisos se vão abster ou distribuir proporcionalmente pelas opções válidas de voto. Pressuposição razoável? Para já, confesso que não me interessa muito. Esta estimativa não visa prever resultados – proposta absurda a quase um mês das eleições e 20% de indecisos – mas é apenas uma maneira de descrever as intenções de voto tal como foram expressas pela amostra no passado fim de semana de uma forma comparável com resultados eleitorais. Quando estivermos mais perto das eleições, os objectivos serão diferentes, a análise dos resultados brutos terá também de mudar, e o tratamento de indecisos e votantes prováveis carecerá de afinação. Mas para já, ficamos assim. A única operação adicional foi a de tomar apenas como válidas as opções “branco/nulo” que tivessem sido reafirmadas numa questão posterior sobre “inclinação de voto”, para evitar óbvias sobrestimações resultantes do recurso ao “branco/nulo” como opção de refúgio de indecisos ou abstencionistas.
Que mais posso dizer sobre a sondagem em si? Como as sondagens feitas até agora foram todas telefónicas, tenho enfatizado até agora os potenciais problemas do uso do telefone como modo de inquirição. Mas agora que sai esta – em que a inquirição foi presencial – importa ver os problemas do outro lado. É certo que dispensar o telefone faz com que o universo representado passe a ser composto por todos os eleitores, quer vivam em domicílios com telefone fixo ou não. Para além disso, a inquirição presencial gera menos recusas, recusas essas que são a primeira séria facada sofrida por qualquer tentativa de geração de uma amostra aleatória (dado que, com as recusas, o universo representado passa a ser não o dos eleitores, mas sim o dos eleitores “que não se importam de responder a sondagens”, e que serão provavelmente diferentes dos outros). Creio, aliás, que esta é a chave para a diferença brutal entre a percentagem de “indecisos” captados por esta sondagem (22%) e as restantes (10%). For my money, 10% é uma grande subestimação daqueles que ainda não decidiram, especialmente quando sabemos, através da sondagem da boca das urnas de 2002, que 15% afirmou ter decidido a sua opção de voto na última semana…
Contudo, a inquirição presencial usada nesta sondagem da Católica também tem desvantagens muito importantes. Por um lado, ela impede o grau de monitorização do trabalho de campo que a telefónica permite. Numa sondagem telefónica, os inquiridores estão sentados em frente a um computador e usam um software que os “guia” de forma rigorosa na condução das entrevistas e no preenchimentos das respostas. Quando se envia inquiridores para o “campo”, tudo se torna muito mais incerto, por muita que seja a formação que se dê. O cumprimento das regras de amostragem e a sujeição de todos os inquiridos a estímulos semelhantes está muito menos garantida numa sondagem presencial.
Para além disso, olhem bem, amanhã no Público, para a ficha técnica: os inquiridores da Católica foram a 19 freguesias do país. 19, em 4621. O objectivo de qualquer procedimento de amostragem descreve-se numa frase: não perder variância potencialmente relevante. Ora, com um telefone, a dispersão dos inquiridos pelo território é fácil, dentro dos limites da ligação dos domicílios a telefones fixos. Contudo, quando se levam inquiridores a localidades espalhadas pelo país, há um dilema: “dispersão” vs. “tempo/dinheiro”. O dinheiro tem limites, e o tempo, nestas coisas, é sempre reduzido: ao contrário do que sucede num inquérito “académico”, onde geralmente o que conta é medir dimensões mais ou menos estáveis dos valores e atitudes dos indivíduos, não faz sentido demorar duas semanas a fazer um inquérito cujo objectivo é descrever mutáveis intenções de voto. Mas há um preço a pagar por isto, que pode ser muito elevado: só se pode ir a poucos sítios, e em pouco tempo. Claro que se tenta mitigar o problema garantindo, através da estratificação, que localidades e inquiridos se encontram proporcionalmente dispersos por habitat e regiões da mesma forma que a população. Outra coisa que se faz, neste caso, é assegurar que, preservando a aleatoriedade, as freguesias escolhidas tendem a exibir, no seu conjunto, um comportamento eleitoral semelhante ao do país. Mas 19 em 4621? Vale a pena meditar no assunto.
Por estas e outras razões, esta sondagem não vos deve merecer, em abstracto ou à partida, nem maior nem menor credibilidade que qualquer outra. Deve merecer a credibilidade que resulta da relação entre os procedimentos que usa e a realidade que está a tentar captar. Se a segunda fosse estável, seria fácil descobrir quais os procedimentos “óptimos”. Mas como não é, a incerteza permanece.
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