Independentemente da controvérsia sobre as sondagens, suas alegadas manipulações e coisas do género, há uma questão substantiva de interesse por detrás de tudo disto. Será que os eleitores que tomam as suas decisões mais tarde fazem opções diferentes daqueles que decidem mais cedo?
Felizmente, não é completamente impossível responder a essa questão.
No inquérito pós-eleitoral de 2005 realizado no âmbito do programa de investigação do ICS “Comportamento Eleitoral dos Portugueses”, coordenado por António Barreto, três questões são relevantes para este efeito. Uma consistiu em perguntar aos eleitores recenseados do Continente se votaram. A outra, e aos que disseram que sim, como votaram. E a terceira, quando decidiram como iriam votar. A última pergunta apresentou os eleitores que afirmaram ter votado perante várias opções: decidiram no próprio dia; na véspera; na semana antes das eleições; no mês antes das eleições; ou antes disso.
Se agregarmos as respostas a esta terceira pergunta em dois grupos – mais de um mês antes das eleições e durante o mês que precedeu as eleições, os inquiridos que afirmam ter votado na eleição repartem-se da seguinte forma: 63,9% afirma ter decido como votar a mais de um mês antes; 33,6% que terá decidido no mês que precedeu a eleição; e 2,5% que afirmaram não saber ou optaram por não responder. Sabemos se foi realmente assim? Não sabemos. Sabemos apenas aquilo que nos dizem. É o que há.
Mas o que acontece quando comparamos a recordação de voto dos dois maiores grupos anteriores? Isto:
De acordo com as suas próprias declarações num inquérito eleitoral, aqueles que decidiram a mais de um mês não se distribuíram da mesma forma que aqueles que dizem ter decidido mais tarde. Neste segundo grupo, o CDS-PP e o BE recolheram mais opções que entre o primeiro grupo. Pelo contrário, PS, PSD e CDU perdem peso entre os late deciders.
O mais curioso é que as sondagens feitas a mais de um mês e a menos de um mês das eleições reflectem, no seu conjunto (o que tenderia a eliminar erros aleatórios causados pelo facto de se estarem a usar amostras) esta tendência (fonte:
aqui e
aqui). Começo no dia 2 de Dezembro, data da primeira sondagem de que disponho. São 8 entre o dia 2 e o dia 20, e 17 sondagens depois do dia 20.
A segunda coluna deste segundo quadro não pode ser comparada com a segunda coluna do quadro anterior, dado que, nele, nos concentramos apenas nos que decidiram a menos de um mês. Mas notem-se as tendências: no PS e no PSD, que recolheram menos opções entre os eleitores que decidiram mais tarde, as sondagens, em média, indicam descida. No CDS-PP e no BE, pelo contrário, as sondagens captaram subida. A única anomalia é a CDU, que subiu, em média, nas sondagens, quando os eleitores que dizem ter decidido no último mês se afastam, proporcionalmente, mais da CDU do que os que decidiram antes. Mas em geral, isto mostra que a distância a que se faz uma sondagem de uma eleição pode contar, porque os eleitores que decidem mais cedo não se repartem necessariamente da mesma forma que os que decidem mais tarde, que representam, como vimos, uma parcela muito considerável dos votantes. Mesmo numa eleição que, em geral, mostrou excepcionalmente baixos efeitos de campanha. Até neste caso, 20,8% dos eleitores afirmaram ter decido na última semana. Imaginem noutros actos eleitorais onde esse efeitos foram muito maiores e não lineares, como este ou este.
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