Sabe o que vai acontecer no dia 23 de Janeiro? Nós sim (II)
Posted November 15th, 2010 at 12:00 pmNo Comments Yet
No post anterior, explicávamos como o conceito de “incumbente” exige, em eleições presidenciais, um tratamento diferente do que sucede com eleições legislativas, onde esse “incumbente” pode ser definido como o partido de governo (ou o principal partido de governo). No caso das presidenciais, essa definição não faz sentido. Como proceder, então?
A nossa opção vai ser a de tentar prever a votação dos candidatos do “bloco incumbente”, ou seja, a soma da votação de todos os candidatos oriundos de uma mesma “área política” – “esquerda” ou “direita” – que, no período imediatamente anterior a dada uma eleição, tenha controlado a Presidência. O que significa isto, na prática? Sete coisas: (1) Nas eleições de 1976, não há ainda Presidente eleito, pelo que esta observação não conta para a nossa análise. (2) Nas eleições de 1980, quem é o Presidente? Eanes, claro. Mas para a nossa análise, e para manter comparabilidade do longo da série, aquilo que nos interessa é o “bloco incumbente”, ou seja, a votação de todos os candidatos, incluindo Eanes, que se situam na área da esquerda. Temos assim Eanes e Otelo, totalizando 57,93% dos votos válidos. (3) Em 1986, o “bloco incumbente” é, claro – e novamente – a esquerda: Soares, Zenha e Pintasilgo: 53,69% dos votos, na 1ª volta. (4) Em 1991, Soares, Carvalhas e Carlos Marques: 85,84% dos votos. (5) Em 1996, apenas Sampaio: 53,91%. (6) Em 2001, Sampaio, António Abreu, Fernando Rosas e Garcia Pereira: 65,32% dos votos. (7) E em 2006, Alegre, Soares, Jerónimo de Sousa, Louçã e Garcia Pereira: 49,46% dos votos.
Em 2011, o que vamos prever é a soma dos votos de todos os candidatos do actual “bloco incumbente”, a direita. Em 2011 – como sucedeu em 1996 – esse bloco será representado por um único candidato, Cavaco Silva. Mas não tinha de ser assim. Esta nossa definição da variável dependente adapta-se a variadas circunstâncias e configurações de cada eleição, pelo menos até se deixar de pensar em política em termos de “esquerda” e “direita”, coisa que, apesar de tudo, não parece estar para muito breve.
A questão que se segue é quais poderão ser as variáveis independentes. Por outras palavras, que factores podem ajudar a prever a votação que o “bloco incumbente” teve no passado e a votação que esse bloco possa vir a ter no futuro? Há muitos factores que poderiam ser imaginados, mas com seis observações apenas, impõe-se máxima parcimónia. A nossa opção vai no sentido de valorizar dois aspectos fundamentais: o apoio partidário dos candidatos do bloco incumbente; e se esse bloco concorre com o Presidente em exercício.
As eleições presidenciais em regimes semi-presidenciais são muitas vezes vistas como um combate entre personalidades políticas, uma espécie de “concurso de popularidade” sem outros determinantes políticos relevantes. De facto, de acordo com alguns estudos sobre comportamento eleitoral, é isso que parece suceder nalguns países onde o chefe de estado é eleito mas não exerce poderes executivos. Em Portugal, análises com dados agregados sugerem uma “baixa fidelidade eleitoral [dos votantes] aos partidos com os quais simpatizam” em eleições presidenciais. Mas temos razões fortes para discordar deste diagnóstico. Um estudo sobre as presidenciais de 2006 mostra que a identificação partidária é um dos factores explicativos mais poderosos quando se trata de prever o comportamento dos eleitores a nível individual. Claro que a avaliação das qualidades dos candidatos também tem um papel muito importante, mas nisso, as eleições presidenciais não são especialmente diferentes das eleições legislativas. O que as distingue, de resto, é o facto de o comportamento de voto nas presidenciais não ser – ao contrário do que sucede nas legislativas – influenciado pela avaliação da actuação do governo. Mas a fidelidade partidária conta muito, o que, de resto, não surpreende: os partidos apoiam candidatos e envolvem-se fortemente nas campanhas. Seria estranho que os eleitores fossem indiferentes ao facto e que os resultados dos candidatos não fossem afectados pela dimensão da sua coligação partidária de apoio.
Logo, para nós, um dos factores preditivos do desempenho do “bloco incumbente” nas presidenciais deve ser procurado no apoio partidário desse bloco. Isso é importante por duas razões. Por um lado, o apoio eleitoral dos partidos da “esquerda” e da “direita” não foi imutável ao longo do tempo, e essas mudanças deverão ter consequências no desempenho eleitoral dos candidatos apoiados por esses partidos. Por outro lado, houve momentos na nossa história eleitoral em que candidatos de um determinado bloco obtiveram o apoio de partidos fora do bloco. O exemplo mais evidente é o de Soares em 1991, cuja candidatura foi apoiada pelo PSD. Não tomar isto em conta seria ignorar a evidência de que os mais de 70% de votos recolhidos por Soares e os mais de 80% dos votos recolhidos por todos os candidatos “da esquerda” (incluindo Soares) não aconteceram por acaso ou por mera “popularidade” dos candidatos.
Assim, julgamos que uma das variáveis independentes de um modelo que procure prever o desempenho eleitoral dos candidatos do “bloco incumbente” terá de remeter para alguma medida do apoio partidário por detrás desses candidatos. Idealmente, gostaríamos de uma medida que captasse esse apoio o mais próximo possível da eleição presidencial, utilizando, por exemplo, sondagens de intenções de voto nesses partidos. Mas essas sondagens não estão disponíveis para todo o período. Outra alternativa seria a de recorrer aos dados das eleições legislativas mais próximas de cada eleição presidencial. Contudo, nalguns casos, essas eleições mais próximas são posteriores à eleição presidencial, o que derrota o objectivo do exercício: prever resultados, na base de informação disponível antes das eleições presidenciais. Logo, a nossa opção foi a de usar como variável independente a soma dos votos dos partidos que apoiam os candidatos do “bloco incumbente” na eleição imediatamente anterior a cada presidencial. A saber:
– 1980: 49,54% de votos válidos (a soma dos partidos de esquerda nas legislativas de Outubro de 1980).
– 1986: 58,40% (legislativas de 1985).
– 1991: 94,47% (esquerda + PSD, legislativas de 1987).
– 1996: 55,30% (legislativas de 1995)
– 2001: 57,46% (legislativas de 1999)
– 2006: 61,67% (legislativas de 2005).
Há pelo menos outro factor tão central para as nossas preocupações que não pode ficar de lado: o facto de, nalgumas eleições, um dos candidatos do “bloco incumbente” ser o próprio Presidente.
Isso nem sempre acontece, claro. Em Portugal, há uma limitação de mandatos para um Presidente: dois. Logo, em 1986, 1996 e 2006, Eanes, Soares e Sampaio não foram candidatos, ao contrário do que sucedeu em 1980, 1991, e 2001, respectivamente. Há boas razões para que isto produza um efeito no desempenho eleitoral. As vantagens genéricas da “incumbência” são conhecidas: visibilidade, cobertura mediática “grátis”, experiência e recursos materiais e organizativos. Isto, por sua vez, dissuade a entrada de bons adversários na contenda: Soares Carneiro, Basílio Horta ou Ferreira do Amaral, com todos os seus méritos ou deméritos, não são Freitas do Amaral, Cavaco Silva ou Mário Soares. E no caso português, é sabido que as expectativas em torno do desempenho da função presidencial têm levado a que (pelo menos desde Soares), nos seus primeiros mandatos, os presidentes tenham adoptado estilos de actuação mais consensuais e menos confrontacionais com os governos, aumentando o seu apelo a eleitores que não pertencem ao seu bloco e aumentando as possibilidades de reeleição. Logo, o nosso modelo tem uma segunda variável: o Presidente em exercício foi um dos candidatos do “bloco incumbente” na eleição? Respostas:
– 1980: Sim.
– 1986: Não.
– 1991: Sim.
– 1996: Não.
– 2001: Sim.
– 2006: Não.
Eis, em suma, o modelo: a votação nos candidatos do “bloco incumbente” numa eleição presidencial deverá ser uma função linear da votação nas legislativas anteriores dos partidos do “bloco incumbente” e do facto de o Presidente em exercício ser ou não um dos candidatos desse bloco. Quando estimamos este modelo através do Método dos Mínimos Quadrados (OLS, para os amigos), que resultados obtemos? Com a informação que já demos, facilmente alguns dos leitores poderão antecipar as nossas previsões. Aos outros pedimos que aguardem por 4ª feira.
Pedro Magalhães e Luís Aguiar-Conraria
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